Diferenças entre os crimes de concussão e corrupção passiva

Não raro, ao se tratar sobre os crimes de concussão e corrupção passiva,  há uma confusão sobre a caracterização de ambos os crimes, isso ocorre porque os tipos penais que do descrevem possuem elementos idênticos, de forma que nas linhas a seguir discorremos, objetivamente, sobre cada um dos crimes e, ao final, apontaremos as principais diferenças entre os dois tipos penais.

O crime de concussão está previsto no artigo 316 de Código Penal, o qual descreve o seguinte:

Art. 316 – Exigir, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida:

Pena – reclusão, de dois a oito anos, e multa.

 

Nesse crime, somente o funcionário público pode ser sujeito ativo do delito, isto é, somente o sujeito que detém essa qualidade pode figurar como autor do crime de concussão e, quanto à vítima, pode ser o Estado, bem como a pessoa física ou jurídica diretamente prejudicada com a conduta praticada pelo sujeito ativo.

Por ser um crime formal, o delito de concussão se consuma quando o agente exige, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida. Assim, caso venha a, efetivamente, receber a vantagem indevida, esse fato será considerado mero exaurimento do crime, que se consumou no momento da sua exigência.

Quanto à corrupção passiva, tem-se que é um crime praticado contra a administração pública, tipificado no artigo 317 do Código Penal, tendo como peculiaridade que somente o funcionário público pode ser sujeito ativo. O tipo penal em tela dispõe o seguinte: “Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente,  ainda  que  fora  da  função,  ou  antes  de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem”.

Dessa forma, as ações nucleares do tipo são: a) solicitar (pedir, requerer), receber (obter, entrar na posse ou detenção) e aceitar (concordar, anuir). Na primeira conduta, a iniciativa é do funcionário, ao passo que nas outras, do particular, o qual figura como corruptor e responde por corrupção ativa. A solicitação da vantagem indevida deve guardar relação com a função pública, em que pese não precisar, o autor, estar em exercício. Haverá o delito, portanto, ainda que o agente se encontre licenciado, em férias ou não tenha assumido o cargo. É fundamental, porém, que o sujeito ativo possa ser considerado funcionário público à luz do artigo 327 do Código Penal.

O tipo penal visa que o funcionário público sofra retaliação e não chegue a se beneficiar indevidamente pela prática de atos de ofício, de modo que se objetiva a tutela do normal funcionamento da administração, figurando como sujeito passivo do crime, o Estado. No que se refere ao momento consumativo, este corresponde ao da solicitação, aceitação ou recebimento da vantagem indevida. A tentativa é, de regra, inadmissível: ou o sujeito recebe ou aceita a vantagem, ou não a recebe ou a recusa.

A propósito das diferenças entre os dois crimes, se percebe que a de maior relevo é em relação aos núcleos das condutas, pois concussão prevê o verbo “exigir”, enquanto a corrupção passiva utiliza os verbos “solicitar ou receber ou aceitar”.

Podemos resumir as distinções pelas lições de Edmundo Oliveira[1], que diz que “o verdadeiro critério para diferenciar concussão e corrupção está na presença ou na ausência de coação; ela existe na primeira e inexiste na segunda. Naquela o funcionário exige; na outra ele apenas solicita, recebe ou aceita promessa”.

Nesse sentido, aliás, obtemperou o Egrégio Supremo Tribunal Federal:

Concussão e corrupção passiva. Caracteriza -se a concussão – e não a corrupção passiva – se a oferta da vantagem indevida corresponde a uma exigência implícita na conduta do funcionário público, que, nas circunstâncias do fato, se concretizou na ameaça. No caso, à luz dos fatos descritos na denúncia, o paciente responde pelo delito de concussão, que configura delito funcional típico e o corréu, pelo de favorecimento real (Código Penal, art. 349) (STF, HC 89686/SP, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, 1ª T., DJ 17/8/2007, p. 58).

 

Da leitura do artigo alhures veiculado, nota-se que crime de concussão tem pena de reclusão, de 2 a 8 anos, e multa e o de corrupção passiva, por seu turno, tem pena de reclusão, de 2 a 12 anos, e multa.

Assim, a concussão e corrupção passiva possuem a mesma pena mínima, mas a pena máxima da corrupção passiva é maior do que a da concussão. Pune-se mais gravemente a conduta de quem solicita ou recebe vantagem indevida do que a conduta daquele que exige vantagem indevida. A desproporcionalidade é notória, uma vez que não há clareza no sentido de que exigir é uma ação mais gravosa que solicitar ou receber.

 

[1] OLIVEIRA, Edmundo. Crimes de corrupção, p. 52.


Publicado em:

09/04/2018